terça-feira, 14 de setembro de 2010

DE EDUCADORES PARA EDUCADORES


A escola está em revolução! Os pequenos projectos que aqui e ali foram surgindo tiveram um
efeito multiplicador. Gradualmente uma turma contagiou a outra e toda a comunidade educativa
ganhou o hábito de questionar a realidade envolvente, reflectir criticamente sobre os problemas
locais e globais, criar formas de intervenção (pessoal e colectiva) que contribuíssem para o bem
comum. As crianças e jovens contagiaram a comunidade local, habituados que estavam a tomar
decisões responsáveis e a assumir um papel comprometido com os valores da solidariedade e da
justiça social na turma, na escola, no bairro,...
O cenário antes descrito seria o desejável, mas infelizmente nas nossas escolas o tom usado não
é o rosa. Bem pelo contrário, às vezes, o vermelho é tão intenso... Afinal, as nossas escolas
fazem parte da sociedade em que vivemos, têm os mesmos problemas e virtudes.
Estão inseridas numa cultura de facilitismos que se reflecte no dia-a-dia. Alguns dos nossos
alunos e alunas quando se deparam com alguma dificuldade tentam desistir da aprendizagem...
Mas, aprender não é tarefa fácil! Aprender não tem de ser fácil. Faz dor de cabeça. É demorado.
Mas repleto de aventuras.
Estão inseridas em sociedades que vivem alicerçadas num pensamento tecnicista. A escola vai
“domesticando” cada criança e jovem tendo em conta as necessidades políticas, económicas e
sociais. Um saber “empacotado” de respostas em “bandejas”. Mas... aprender não é assim!
Aprender é despertar uma reflexão crítica baseada, simultaneamente, em factos concretos do
mundo actual e nas suas próprias vivências. É partir daqui para projectarmos os nossos alunos e
alunas mais além: analisar e questionar situações locais e globais, evidenciar as interligações e a
interdependência presente entre todas as pessoas, regiões e países, descobrir as nossas próprias
verdades. Um constante movimento de construção, desconstrução e reconstrução.
Estão inseridas numa cultura em que os outros - seja o Estado, sejam os nosso superiores
hierárquicos, sejam os nossos familiares e amigos,... - têm responsabilidades das quais, por este
ou aquele motivo, fugimos através da arte da desculpa e da sua fundamentação. Mas, neste
planeta, nada do que deixamos de fazer ou do que fazemos é alheio ao destino das restantes
pessoas. E para nós, enquanto educadores e educadoras, isso é muito mais verdade! Não somos
seres neutros, somos seres éticos e políticos: fazemos opções e tomamos decisões
comprometidas com os nossos valores, ideias e ideais e que influenciam as crianças e jovens com
quem trabalhamos, os nossos colegas, as nossas direcções...
Por exemplo, a quem cabe a tarefa de seleccionar as estratégias que melhor se adequam às
características dos nossos alunos e alunas e que melhor servem os objectivos a que nos
propomos?! E esta opção tem um papel importantíssimo na construção de aprendizagens
significativas...
Se optarmos por um ensino pela descoberta podemos dar oportunidade aos alunos e alunas de
realizarem experiências e trabalhos de pesquisa de forma autónoma. Sob a nossa coordenação,
podem explorar as suas próprias questões, promover o seu espírito de observação, de iniciativa,
de capacidade crítica, de curiosidade científica e de partilha e colaboração.
Se quiseremos abrir a escola à comunidade e ao mundo, a aprendizagem resulta em infinitas
aventuras pedagógicas. Optamos por uma forma de combater a insularização dos saberes,
mostrando que o currículo não é apenas o plano ou “currículo prescrito” mas também o “currículo
vivido”. Por uma forma de povoar o descampado dos saberes importantes com novos sentidos. É
possível experimentar aí os sentimentos de sucesso e de fracasso, as sensações de insegurança
e incompletude, tal como na vida – uma verdadeira “pedagogia da incerteza”, colectivamente
assumida e saboreada.
Em ambos os casos temos uma convicção: acreditamos que cada um pode ser o construtor do
seu saber, do seu processo de aprendizagem. Deixamos de querer “presentear” os alunos e
alunas com sumulas mais ou menos complexas e iguais todos os anos, deixamos de nos revelar
avessos às mudanças para passar a acompanhar, a desafiar, a apoiar e avaliar todo o processo
educativo.
E, claro, que um trabalho finalizado acarreta, inevitavelmente, milhares de outros por começar. Ao
reflectirmos sobre um processo remexemos em memórias acabadas de chegar, esgravatamos no
terreiro das concretizações, levantamos insatisfações – ideias por realizar ou, definitivamente,
abandonadas - ... tudo já em estado de nova construção. E com toda esta mexida sente-se uma

agradável aragem que acorda e recarrega as nossas mais fortes determinações. A nossa
criatividade. A nossa energia.
Bem, com tudo isto e com todo o percurso efectuado por nós (incluindo o desalento que sentimos
em determinadas fases) queremos dizer-vos que fica a necessidade de agir, de construir um
mundo em que deixamos de ser espectadores e passamos a ser actores, reformulando, tantas
vezes quantas necessárias, o nosso caminho enquanto educadores e educadoras.
Porque, afinal, é impossível não estar co(i)mplicado nos acontecimentos do nosso mundo.
Porque, afinal, hoje os nossos desafios são mais complexos, mais ambiciosos, mas educar
continua a ser uma tarefa muito enriquecedora e gratificante. Porque, afinal, para nós as situações
imprevistas que se nos deparam são desafios e não condenações. Porque, afinal, temos de lutar
pelo nosso valor social, pela nossa importância. Porque, afinal, somos os que ainda podem fazer
sonhar. Porque as nossas escolas podem não ser fáceis ou as melhores no ranking escolar, mas
certamente são lugares especiais porque nelas estamos nós!

Ana Lagoa, Fátima Capelo, Fátima Roldão, Graça Delgadinho, Graça Dias, Luísa Costa,
Maria Reina Pimpão, Patrícia Santos (org.), Ricardo Cipriano, Rosa Fernandes
Julho de 2010
Professores/as participantes na Oficina de Formação “Educação para a Cidadania Global na
escola”, dinamizada pelo CIDAC - Centro de Informação e Documentação Amílcar Cabral, em
parceria com o Centro de Formação Professor Orlando Ribeiro - Associação de Professores de
Geografia. Para informações sobre esta Oficina contactar o CIDAC através do e-mail ed-
ps@cidac.pt.
O presente artigo foi escrito a várias mãos pois integra citações de textos elaborados pela
educadoras e educador acima citados.

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