Com a devida vénia, publico o texto do Dr. Fernando Ilídio Ferreira, que merece a nossa leitura e meditação.
"A escola é uma instituição educativa; uma comunidade democrática de aprendizagem. Neste sentido, qual é a sua missão, o seu objectivo, o seu desafio? É “combater a violência” ou “promover a convivência"? Talvez para muitos pareça apenas uma questão de terminologia mas, na minha perspectiva, estamos perante diferentes racionalidades e, até, paradigmas em relação ao modo como encaramos e lidamos com a mudança dos processos de ensino e da aprendizagem.
Ao ler vários documentos de escolas - projectos educativos, regulamentos internos, e outros – deparo-me, frequentemente, com expressões como: “combater o insucesso”, “combater o abandono”; “lutar contra a indisciplina”; “combater a violência”, “combater o "bullying", etc. Claro que a utilização destas expressões é, quase sempre, inconsciente. O problema é que, em Educação, tal como noutras áreas, não podemos perder a consciência e a lucidez. O fenómeno de “naturalização” de um determinado tipo de linguagem, que está patente no uso frequente de expressões como as que mencionei acima, parecem revelar que a Escola está a inspirar-se mais nos modelos militares e policiais – o que transparece, desde logo, na “linguagem bélica” utilizada - lutar, combater, etc. - em vez de se inspirar em perspectivas educacionais tão importantes como as de John Dewey, Celestin Freinet, Paulo Freire e de muito outros, as quais apontam caminhos alternativos, baseados nos valores da democracia, liberdade, cooperação, convivência , entre outros.
Enquanto instituição e organização educativa, a Escola é (deveria ser) um espaço de paz e tranquilidade propícios ao trabalho e à convivência, entre alunos, professores e demais actores educativos locais. Sem estas condições, os professores podem "ensinar" e os alunos "aprender" muitas "matérias", sobretudo para tirarem boas notas nos exames, mas não aprendem o que é mais importante na vida, nas múltiplas dimensões que lhe dão sentido: cognitivas, sociais, estéticas, éticas, afectivas, emocionais, etc. Sem um ambiente onde se respire tranquilidade, a escola não tem condições para promover a reflexão, a concentração, a meditação, o espírito crítico, a criatividade, o gosto pelo esforço e pelo trabalho bem feito.
Temos passado por várias reformas educativas ao longo das últimas décadas. No entanto, a minha perspectiva é de que já não vamos lá com "reformas" e muito menos com "medidas" legislativas avulsas que obrigam os professores a despenderem quase todo o tempo na leitura e interpretação de decretos-lei, despachos, portarias, circulares, etc., em vez de orientarem o tempo – um dos bens mais preciosos que temos, hoje - e a energia para trabalharem e conviverem com os alunos. Portanto, defendo que em Educação, não precisamos de mais reformas mas de uma revolução! Uma revolução que não seja arrogante, que não pretenda inventar tudo de novo, atribuindo, apenas, nomes diferentes às coisas - como tem acontecido nas sucessivas reformas educativas e curriculares - mas uma revolução que, com humildade e sensibilidade, nos permita aprender com o legado educacional do século XX e até de séculos anteriores. Do meu ponto de vista, questionar e superar a mentalidade dominante em Educação, fortemente influenciada pela lógica da “engenharia” (engenharia curricular, engenharia da formação, etc.) - lógica projectada ansiosamente no futuro e geradora de um défice de presente e de um desprezo pelo passado - sugiro duas metáforas alternativas para uma "revolução da educação”: a metáfora da "arqueologia" e a metáfora da "agricultura". Podemos organizar uma "tertúlia" para aprofundarmos e debatermos estas questões.
Fevereiro de 2011
Universidade do Minho – Instituto de Educação"
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