segunda-feira, 15 de novembro de 2010

DE MÃO ESTENDIDA

Há uma placa colocada por baixo do nome "Portugal" que diz "vende-se". E outra ao lado que anuncia "saldos". É comprar agora que está barato. Vendemos de tudo um pouco. Dívida com excelente remuneração, ações de bancos ao preço de um café, participações que deixaram de ser estratégicas. É só escolher. E pagar, claro. A necessidade interna é muita, o apetite externo ainda maior. O governo é uma espécie de agência de liquidação de um país falido. Até agora viveu a crédito. A partir de agora está nas mãos dos credores. Como um fidalgo arruinado tenta vender os anéis para salvar os dedos. Em desespero esquece princípios em nome da salvação.

O governo está de mão estendida. O primeiro a responder foi o patusco Chávez. Ofereceu-lhe as duas. Em jornada insólita, pelo norte do país, prometeu comprar de novo o que já tinha comprado há dois anos, não um barco, mas muitos, não apenas as casas pré-fabricadas que já deviam estar montadas, mas cidades inteiras, e computadores "Magalhães", milhares e milhares deles.
Depois vieram os chineses. Sentados em cima da maior reserva monetária do mundo, foram recebidos como uma espécie de 'tio Patinhas' do novo século. Querem um banco? Temos aqui o BCP a jeito. Energia? Porque não a EDP? Dívida? Temos muita e a bom preço. O catálogo é imenso. É só escolher.
Os novos salvadores da nação juntaram-se aos velhos. Os angolanos continuam às compras. À Líbia deslocou-se uma comitiva que foi oferecer sabe-se lá o quê. Longe vão os tempos em que a Espanha e o Brasil eram as prioridades da nossa política externa. Agora a prioridade é encontrar quem compre. Não interessa o regime, muito menos o carácter das personagens. O dinheiro é que conta.
Agora a prioridade é encontrar quem compre. Não interessa o regime, muito menos o carácter
das personagens
Ora, nos tempos que correm há muito dinheiro que está nas 'duas mãos' de ditaduras, como a China, ou de ditadores, como Chávez ou Khadafi. Todo? Não! Há também dinheiro do outro lado. Só que esse é mais difícil. Tem critérios. Exige disciplina na sua utilização. Não é dinheiro fácil. Como, na realidade, o outro também não é. Tudo tem um preço.
No outro lado estão os mercados. E a senhora Merkel. Ambos perigosos inimigos do nosso estilo de vida. Os primeiros são dominados pela especulação. A segunda é uma chata, que não gosta que os outros gastem o que não têm. Principalmente quando é ela a pagar. São eles os culpados dos nossos problemas. O ministro das Finanças náo tem qualquer dúvida sobre o assunto. Os juros sobem por causa da ação conjugada da especulação e da senhora Merkel.
É uma certeza que sempre dá algum conforto a quem se mostrou incapaz de cortar 5OO milhões de euros num total de oito mil milhões que o Estado precisa para funcionar. Pedir é mais fácil que cortar. E o Estado o que faz é pedir. Pede a toda a gente. Vive de mão estendida à espera de uma esmola para manter uma ilusão.
Essa ilusão vai-nos sair muito cara. Venderemos o que o país tem de melhor, a preço de saldo. E o que o país tem de melhor é a alma, é a dignidade, que estão a ser arrastadas para uma humilhante feira de ocasiáo.

Luís Marques

l.s.marques@sapo.pt

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